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Joseane de Carvalho Leão - Economista, mestre em Políticas Públicas e professora de Administração da Uespi
Com a economia do país passando por dificuldades nos últimos anos, situação que se agravou com a chegada da pandemia da covid-19, um tema tem ganhado atenção especial por parte dos brasileiros: os seguidos aumentos dos preços dos combustíveis desde o início de 2021. É uma dor de cabeça a mais em um contexto de dificuldades econômicas em que vivemos.
Pois bem, um primeiro esclarecimento que precisa ser feito se refere a essa flutuação constante. Trata-se, na verdade, do resultado de uma política que é adotada desde 2016, quando no governo de Michel Temer a Petrobras passou a adotar a prática da paridade Internacional de preços, que significa, de acordo com texto disponibilizado no site da Petrobras, que os preços para a gasolina e o diesel vendidos às distribuidoras tem como base o preço de paridade de importação, formado pelas cotações internacionais destes produtos mais os custos que importadores teriam, como transporte e taxas portuárias, por exemplo.
- Os preços para a gasolina e o diesel vendidos às distribuidoras tem como base o preço de paridade de importação.
Em linhas gerais, isto significou que variações nos preços dos barris no mercado internacional e/ ou variações cambiais do dólar deveriam ser repassadas diretamente ao consumidor final. Importante ressaltar que essa flutuação às vezes favoreceu o consumidor porque em alguns momentos específicos isso significou redução de preços. No entanto, quando se observam os últimos anos a conclusão é que, sim, o preço variou para cima.
Pensando especificamente nas variações ocorridas nos últimos seis meses, podemos elencar dois grandes motivos como fatores contribuintes: o aumento do preço do petróleo no mercado internacional e a alta do dólar. Em 2020, a pandemia e a necessidade urgente de paralisação das atividades econômicas promoveram a redução da demanda mundial com efeito imediato de queda no preço do Barril de petróleo. A princípio este fato poderia ser visto como favorável, mas diante da produção ficou excessiva e demanda reprimida, a Organização dos Países Exportadores de Petróleo (OPEP) resolveu reduzir a produção como forma de controlar a desvalorização.
A partir daí, e com a retomada gradual das atividades, o valor do barril de petróleo começou a subir e, associado à valorização dólar, formou-se um cenário perfeito para elevação de preços. Como a nova política da Petrobras elimina atores intermediários que ajudam a definir preços, o consumidor sentiu, de forma direta, o efeito desta equação. Além disso, é importante ressaltar que o projeto de desinvestimento das refinarias, através de privatizações impacta, segundo especialistas no assunto, em aumento do custo dos combustíveis para as distribuidoras com consequente maior impacto para o consumidor final.
- A Petrobras tem acionistas que não estão muito interessados em abrir mão dessa flutuação em prol de ganhos privados
E como essa dinâmica de flutuação opera na formação de preços pela Petrobras? Como se sabe, a Petrobras é uma Sociedade de Economia Mista com controle majoritário da União. No entanto, a Petrobras tem acionistas que não estão muito interessados em abrir mão dessa flutuação em prol de ganhos privados. Como se diz por aí: é o mercado, são os negócios. Desde 2016, com esta nova orientação, não está no arco de possibilidades que a Petrobras atue para reduzir o impacto destas oscilações subsidiando preços para o consumidor final. Não podemos esquecer que a orientação política desde então tem-se guiado por princípios de não intervenção no mercado, e é somente isto o que a empresa tem feito.
Para além desse olhar mais global do processo de formação de preços, é necessário analisar, por dentro, para entendermos como o valor pago pelo consumidor final é composto. Precisamos avaliar, dessa forma, quatro fatores: 1) Preços do produtor ou importador de gasolina, 2) Carga tributária, 3) Custo do etanol obrigatório na composição do produto da gasolina e 4) Margens de lucro da distribuição e revenda.
Os casos da gasolina e do diesel têm as suas particularidades, é preciso deixar claro. No entanto, em ambos a atuação da Petrobras tem um peso fundamental. O diesel, em razão da composição majoritária do petróleo na sua composição, é afetado mais diretamente pela oscilação dos mercados.
A influência da carga tributária nos preços praticados no Brasil não é novidade para ninguém e, assim, impostos como ICMS, PIS/ Pasep e Cofins, e Cide fazem uma diferença fundamental. A solução de redução destes impostos seria uma saída para a redução, mas não esqueçamos que o estado brasileiro, nos diversos níveis de poder, vive uma situação fiscal delicada e que se agravou em razão da pandemia e essa redução impactaria no orçamento para seguridade social, portanto na saúde, assistência e previdência.
O Governo Federal, que dispõe da possibilidade de recorrer a outros fundos, vem ensaiando a redução de PIS/PASEP, Cofins e CIDE. Os governos estaduais, por sua vez, premidos pela situação fiscal tem menor margem de manobra para abrir mão de parte da arrecadação com o ICMS.
- Os governos estaduais, por sua vez, premidos pela situação fiscal tem menor margem de manobra para abrir mão de parte da arrecadação com o ICMS.
Portanto, do ponto de vista tributário, como vemos, a equação não se apresenta tão fácil como se quer fazer crer nos discursos proferidos atualmente. Há, ainda, o componente referente aos lucros do produtor ou importador, o custo do etanol anidro (no caso da gasolina) e do biodiesel (no caso do diesel) e margens do distribuidor e revendedor. Aqui, como se sabe, atuam especificamente ato- res privados. Neste terreno, a realidade nos mostra cotidianamente, o altruísmo não costuma fazer muito sucesso. Atores privados visam maximização de ganhos é o que nos ensina a teoria econômica clássica.
Segundo o infográfico da Petrobras, “os custos de extração de petróleo nas refinarias não de- finem o preço da gasolina, pois se trata de um mercado de commodities, atrelado à variação internacional. Isso ocorre em qualquer país cuja economia é aberta, onde pode haver importações e exportações e onde haja a livre concorrência”. Dessa forma, uma intervenção nos preços abaixo do que vem sendo praticada externamente gera uma perda de valor de mercado e consequentes perdas para a empresa (Petrobras) no mercado financeiro.
Por outro lado, quando essa força do cartel e da volatilidade com relação ao dólar é repassado para o consumidor final isso gera uma pressão enorme para o governo por uma política de subsídios, tanto pela classe dos caminhoneiros como pela população de uma maneira geral. Gerando um impasse para o governo, se atende a pressão social da população, o que tornaria os preços ainda mais defasados em relação ao preço praticado lá fora e contrariando os acionistas do mercado financeiro.
(Este artigo faz parte do projeto “Colunistas UESPI” e foi publicado originalmente no site da Universidade Estadual do Piauí)
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Fonte: Joseane de Carvalho Leão - Economista, mestre em Políticas Públicas e professora de Administração da Uespi